quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

O Papagaio Real

Há 121 anos nascia uma menina aquariana, livre por natureza e mandona como só ela num tempo em que as mulheres tinham que ser obedientes e cordatas. Problemas teve muitos, mas criou seus filhos e esta neta para quem foi a primeira contadora de histórias. Desfiava contos conhecidos e alguns tão estranhos que eu tinha certeza que saíam ali mesmo daquela cabeça prateada. Apresentou-me mundos, gigantes, sóis e luas. Depois de anos achei este conto tradicional brasileiro que ela recheava com muitos elementos. Aqui vai a história como se conta hoje.




O Papagaio Real

Duas irmãs moravam juntas, mas a mais velha era muito boa e a mais nova, maldizente e preguiçosa. Várias noites seguidas, a mais nova escutou um barulho de asas e depois a voz de um homem no quarto da sua irmã. Achou aquilo muito esquisito. Certa noite, resolveu espiar pelo buraco da fechadura. Viu, no meio do quarto, uma bacia cheia de água.

Quando bateu a meia-noite, chegou na janela um papagaio enorme e muito bonito. A ave voou para dentro do quarto, entrou na bacia e sacudiu-se, espalhando água para todos os lados. Cada gota que caía se transformava numa moeda de ouro e, quando o banho terminou, o papagaio tinha se transformado no príncipe mais formoso do mundo. Ele se sentou do lado da irmã mais velha, tomou sua mão e os dois começaram a namorar.

Louca de inveja, a irmã mais nova resolveu acabar com aquela história no dia seguinte. À tarde, quando a irmã não estava, encheu o peitoril da janela e a bacia com cacos de vidro que eram invisíveis de tão transparentes. À noite, o papagaio chegou e, batendo asas no peitoril, cortou-se todo. Voou para a bacia e cortou-se mais ainda. O papagaio não virou príncipe, arrastou-se até a janela e disse para a moça, assustada com o que sucedera:

– Ingrata! Agora, se quiseres me ver, só no reino de Acelóis.

Batendo as asas ensanguentadas, desapareceu. A moça quase se acabou de tanto chorar. Brigou muito com a irmã invejosa e deixou a casa, decidida a procurar o noivo mundo afora. Andou por muitos lugares. Empregou-se como criada nas casas, só para perguntar onde ficava o reino de Acelóis. Ninguém sabia ensinar e a moça foi ficando desanimada.

Depois de muito viajar, viu-se perdida numa floresta. Com a chegada da noite, resolveu subir numa árvore para descansar. Foi aí que viu algumas aves conversando e ficou sabendo que uma delas seguia justamente para o reino de Acelóis. O príncipe estava muito doente. Para curá-lo era preciso dar-lhe de beber três gotas de sangue do dedo mindinho de uma mulher que quisesse dar a vida por ele.

Na manhã seguinte, a moça prestou atenção na direção que a ave seguia e pôs o pé na estrada. Quando o sol se punha, avistou o reino de Acelóis. Pediu abrigo na casa de uma família de camponeses e, ali, ficou sabendo das novidades. O príncipe continuava doente e o pássaro que descobrira o modo de curá-lo havia sido morto por um gavião quando chegava perto do palácio real.

No outro dia, a moça saiu à procura do rei, o qual já recebia qualquer pessoa que lhe prometesse salvar seu filho, o príncipe. A moça lhe disse, então:

– Posso curar o príncipe, se Vossa Majestade me der, de tinta e papel passado, a metade do reino e de tudo que lhe pertencer.

A contragosto, o rei aceitou a proposta. A moça foi para o quarto do príncipe, furou o dedo mindinho e derramou três gotas de sangue nos lábios do doente. Assim que as engoliu, o príncipe abriu os olhos e levantou-se da cama. Quase não acreditou, ao reconhecer sua salvadora. Foi, então, falar com o pai. Disse que aquela era sua verdadeira noiva desde quando ele estava encantado em um papagaio real. Queria se casar com ela. O rei não gostou, pois não se tratava de uma princesa. Negou seu consentimento.

– Vossa majestade me deu a metade de tudo que lhe pertence – disse a moça, exibindo seu contrato. – Se não posso me casar com o príncipe, vou cortá-lo ao meio e levar a metade comigo.

Ao ouvir falar em cortar o príncipe pelo meio, o rei voltou atrás e deu seu consentimento. Os dois se casaram e foram felizes para sempre.

2 comentários:

Samira disse...

Sabia que você iria escrever sobre ela hoje!!!
Beijos

Lu Saharov disse...

Esses avós dentro da gente...Como seríamos sem a sua rica presença em nossas vidas? Adorei, o conto e sua avó! beijos!

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